quinta-feira, 2 de junho de 2011

Violência, sexo e aulas de Marymárcia Guedes


Nada além de uma boba constatação: tudo muda, de regências verbais a reinados e pessoas. Vivemos o tal futuro previsto e dito nas décadas de 40, 50, 60... épocas em que costumes estanques resistiam a mudanças e mesmo aos continuísmos. Costumes são recortes da existência, enquanto continuísmo é uma moda sem graça datada no degradée dos tons pastel. Algum dia pretoembranquece.
Costumes nos fornecem nortes que ora no sul, ora no leste direcionam nossas rotinas e nos reduzem a retornos constantes. Hoje, neste futuro presente, somos perigosos e mansos, pratos servidos aos nossos iguais, consumidos e regurgitados constantemente pelos símbolos canibais de uma verborragia inoperante.
Canibais de toda sorte e azar, devoramo-nos sem o dó e a piedade que enriquece frases de efeito. Não está longe nem perdida a doce época de espanto exagerado diante selvagerias e outros hediondos mostrados como notícias no disse-me-disse cotidiano, boca-a-boca, tetê-à-tête do sobre o muro de vizinhos que assim conheciam o que foi. Preveniram-se do que há. Sabe-se lá o que virá!
Não. Hoje, canibais dão-se à celebridade dos telejornais que exaurem a osmose pela repetição.  Não tardará, teremos chamada oral em órgãos públicos: - Vistes o que te informa? É não! -Toma negativo!
Na época antiga comia-se algo. Hoje se come alguém. Até o estilo livre da língua ela - mesma e a Norma, que nem é tão culta quanto MARYMÁRCIA*, rende-se ao prazer de render-se, ser devorada, defenestrada, tangida, rearrumada. Aquilo de ruim no amálgama hodierno é o poluído que encima a primeira ideia: o estupro é a síntese de tudo o dito. Ruminante, o outsider deglute o respeito ao próximo, vale-se da força para confirmar a nova regência verbal e vez ou outra, engole sem mastigar o mais e o menos que, bem possível, eram o melhor e o pior da vítima.
No enfim de cristalizar-se enquanto notícia vai nosso pasmo ora dentuço, ora linguarudo expressar-se com caretas e não mais com sentimentos.
*Marymárcia Guedes é Profa. Dra. de Linguística da Unesp/Araraquara

ROGÉRIO LOPES

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